Há tristezas que são quentinhas. Como que um cobertor leve e confortável, mascarando-se de um par de dias, de um par de horas. Afunda-nos apenas o suficiente para podermos pensar com outra mente. Encolhemo-nos um bocadinho e, do nosso novo canto, podemos ver quem somos duma forma mais apurada, mas ainda assim enviesada. Vemos algumas coisas que fazemos, que somos, como estranho e sem grande sentido. Como é uma tristeza apenas quentinha, como não é fria, gélida, permite-nos sorrir como quem não quer a coisa, achar-nos piada, achar-nos um bocado estúpidos e ingénuos.
Ouve-se, classicamente, uma música nada alegre, para prolongar mais um pouco o sentimento que dizemos não gostar de sentir. Deus nos livre de admitirmos que por vezes gostamos de estar tristes. Seria terrível… sorrio. Fecho os olhos e deixo a melodia amarelada entrar por mim adentro. Encosto a cabeça na parede de estranha tinta atrás de mim e deixo-me levar, por uns segundos, para dentro de mim. Às vezes, uma parte mais preguiçosa de mim gosta de não gostar da euforia. Tudo seria muito mais fácil se tivéssemos apenas um caminho a seguir. Deus, que seria de nós apenas com uma estrada, sem decisões?… Entendo estes meus pensamentos. Não fico assustado, ou nervoso, porque sei que deixar em palavras questões que apenas esporadicamente me habitam não me acostumará a esta normalidade aborrecida. Sei que daqui a uns segundos, minutos, horas, a alegria do não-saber voltará, como sempre o faz. Mas… que dizer? Por mais fortes que nos sintamos em relação a uma ideia, a uma filosofia ou modo de estar, que significaria se não o questionássemos de vez em quando? Não seria algo cego e sem sentido? Que são das ideias sem questões? E a minha questão de agora prende-se única e exclusivamente com a infinidade de estradas que vejo, ou gosto de ver, diante de mim. Vejo estender-se à minha frente dois mil e dois futuros, cada um me seduzindo por diferentes razões, cada um me afastando terrivelmente. Sei apenas que não escolherei não escolher. Sei apenas que, faça o que fizer, sempre o verei, em mim, como ir para algum lado, mais do que fugir doutro sítio qualquer. Pá, não sei… É estranho quando certas certezas que temos de repente decidem que afinal… não é bem assim. Mas como sabe tão bem ter razões para esta tristeza quentinha… Como sabe bem saber que temos tudo à nossa frente… Não interessa a idade, o quando, o porquê… Nada interessa senão o tudo de que nunca abdicaremos. Vejo esta tristeza quente como a irmã e amante incondicional da euforia da indecisão. Abraça-me e não me deixes, ou deslizarei a caminho da nulidade de tudo saber…